Em uma entrevista, Abbas Kiarostami fala sobre sua relação com a poesia como um lugar de felicidade no qual ele tem se refugiado constantemente ao longo da vida. A poesia visual de Onde Fica a Casa do Meu Amigo? e a jornada épica de Ahmed em sua missão de devolver o caderno de seu amigo genuinamente me trazem a felicidade que o diretor iraniano descreve e, ao nos tornar pequenos, tornam-se uma obra grandiosa.
Historicamente, no cinema, a figura e a ideia do Oriente são comumente representadas com um viés de exoticidade ou como um lugar estranho. Mas a delicadeza e o carinho com que o diretor-poeta nos envolve e nos aproxima de sua cultura, por intermédio de episódios tão domésticos que aprofundam a realidade dentro da ficção, são alguns dos toques encantadores da obra. Sejam as cenas do bebê chorando, das mulheres lavando roupas ou arrumando a casa, o papel masculino dentro da divisão de afazeres domésticos e a responsabilidade de cada membro da família, esse mundo se apresenta ao espectador de forma espontânea, quase sempre me fazendo esquecer que é ficção.
A trama, que se desenvolve de forma muito circular durante um único dia, com uma fórmula que funciona extremamente bem em suas sutilezas, carrega questões complexas sobre o papel da criança em uma sociedade tão adultocêntrica. A direção de Kiarostami, tanto no modo como ele conta a história quanto na forma como os atores são dirigidos em seus filmes, é essencial para sua identidade como cineasta e para o sucesso de Onde Fica a Casa do Meu Amigo? O uso de não-atores, nesse caso, faz com que a personalidade dos atores mirins se torne matéria-prima do filme, trazendo uma fruição que deixa a história um nível mais imersiva.
E é nessa imersão que nos tornamos crianças, onde o problema de Ahmed, que não significaria nada sério em qualquer outro contexto, agora mexe profundamente com o emocional de quem assiste. Frustrando-nos nas cenas em que finalmente parece que o personagem vai encontrar seu amigo, mas mais uma vez falha; dando raiva quando ele explica a seriedade de estar com o caderno do amigo e os adultos parecem não entender; ou colocando os nervos à flor da pele na cena final, quando o professor se aproxima de Mohamed para olhar se a lição de casa está feita.
A premissa tão simples do diretor iraniano consegue, entre os belos planos dos olhares complacentes de Ahmed, questionar o papel do professor como figura central de ensino e o papel do adulto e da criança nas relações de poder, enquanto nos lembra que nunca devemos perder a empatia, a cumplicidade e a afetividade da infância. Apesar de ser um filme de 1987, sempre que assisto tenho mais esperança no futuro.
Nota da autora:

| Título Original | Khane-ye doust kodjast? |
| Lançamento | 1987 |
| País de Origem | Irã |
| Distribuidora | Janus Films |
| Duração | 1h23m |
| Direção | Abbas Kiarostami |
Onde Assistir?
(não oficial)





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