O Casamento de Maria Braun [Crítica]

Em O Casamento de Maria Braun (1979), de Rainer Werner Fassbinder, somos apresentados à história de Maria Braun, que, após se casar, vê seu marido ser imediatamente enviado para a guerra, desaparecendo em combate. Acompanhamos a esperança de Maria de que, um dia, seu marido volte, enquanto ela tenta sobreviver e sustentar sua família na Alemanha do pós-guerra.

A cena inicial de O Casamento de Maria Braun tem um tom de tragédia quase cômico, de um humor ácido que combina com o cinismo da protagonista. O casal, desesperado para conseguir se casar, quase ignora o fato de que tudo ao seu redor está sendo destruído, fazendo de tudo para que o oficial de matrimônio realize a cerimônia no cenário apocalíptico. A insistência de ambos os personagens, de certa forma, apresenta a reciprocidade dessa paixão avassaladora quase cega. Mas não é suficiente para que, na parte inicial, não haja um julgamento às ações de Maria, considerando que ela ficou casada tão pouco tempo antes que Hermann fosse levado.

Maria Braun é uma daquelas personagens quase impossíveis de não se apaixonar, principalmente por seu equilíbrio diabólico e meio divino de cinismo e paixão. Tudo o que ela faz é em nome do amor, da vontade de viver uma vida que lhe foi privada pela guerra, da espera por Hermann. Por conhecermos tanto a personagem em um cenário de ausência de seu par amoroso, é impossível não duvidar se seu marido seria capaz de amá-la na mesma intensidade, de esperar por ela por anos, mesmo depois de tê-la dado como morta. Essa protagonista tão singular e complexa é o reflexo da Alemanha Ocidental no pós-guerra, disposta a tudo para sobreviver e se reerguer das ruínas. Se os soldados alemães retornam a um país em entulhos e ruínas, Maria toma como motivação o possível regresso de Hermann para se reinventar, conquistar uma autonomia e tentar seguir emfrente.

No aparecimento de Hermann, que encontra Maria e Bill, um soldado americano com quem ela nutria um caso, na cama, e após uma briga, Maria mata Bill como gesto de fidelidade a Hermann. Hermann se apresenta como culpado e é preso. Temos a confirmação de que Maria Braun é amada na mesma intensidade que ama. Na cena do julgamento, mesmo vendo seu marido ser condenado, Maria mantém o semblante feliz de quem está pronta para enfrentar o que o destino lhe oferecer, com ar de quem cai, mas logo se levanta.

Com seu marido na prisão, Maria conhece, seduz e se torna amante de Oswald, um industrial franco-alemão, e ascende socialmente muito rápido. A disparidade social entre Maria e Hermann faz com que, quando o homem sai da cadeia, ele decida sair do país para conseguir dinheiro e se igualar à sua mulher.

A transição da personagem, tanto social quanto subjetivamente, é muito marcada pelo ambiente em que ela vive. Se antes, na casa da mãe, morava em uma casa com um buraco na parede que relembra a guerra, e sempre estava voltando ao seu antigo bairro destruído para relembrar o passado, a nova Maria se muda para uma casa gigante e mora sozinha. Mais uma queda: com a ida de Hermann, Maria se torna um pouco mais fria, às vezes cruel, mas ainda esperançosa por uma vida com seu marido, apesar de se manter amante de Oswald.

Na parte final, com a morte de Oswald, que deixa seus bens para Maria, e o retorno de Hermann, temos uma das melhores cenas que vi nos últimos dias. Se nos créditos iniciais a trilha sonora nos ambienta na destruição, isso se repete, mas com mais potência e precisão. Finalmente, Maria e Hermann podem viver a vida que tanto lutaram por, mas o que fazer quando o futuro chega? Eles ainda são as mesmas pessoas por quem tanto lutaram? Como quem passa a vida subindo o mais alto que pode, não para chegar ao céu, mas para que a queda seja maior, o melodrama se consuma ao som de uma Alemanha campeã da Copa de 54. Mas o que ficou pelo caminho?

Gessica Lima

Título Original	Die Ehe der Maria Braun
Lançamento	1979
País de Origem	Alemanha Ocidental
Distribuidora	Rainer Werner Fassbinder Foundation
Duração	2h
Direção	Rainer Werner Fassbinder

Onde Assistir?
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