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O Mentiroso [Crítica]

Depois de um hiato pessoal, retorno aqui meu hábito de escrever críticas de filmes. E logo com esse filme que para mim foi uma experiência muito especial. Além de ser recompensador por tê-lo visto depois de um bom tempo sem assistir filmes, ainda foi uma indicação inesperada de uma pessoa querida. Somado a todo esse contexto pessoal, a produção ainda foi uma surpresa muito agradável e que me fez voltar a ver o cinema como um lugar agradável e transformador. O filme me garantiu muitas gargalhadas, surpresas intrigantes em seu subtexto e ainda me fez se emocionar de um jeito bastante pessoal.

A obra acompanha o advogado Fletcher Reede, interpretado por Jim Carrey – e essa é uma informação importantíssima para o desenvolvimento do filme. Fletcher é um ser carismático e que tem uma lábia formidável, principalmente por sua habilidade incrível em mentir. Isso o faz se destacar no seu ambiente de trabalho e desenvolver até mesmo uma fama jurídica. Porém, essa sua especialidade acaba o afastando de um outro ambiente, o familiar. Quando, de repente, ele perde a sua habilidade quase sobre-humana de mentir, isso acaba mostrando para ele as consequências de sua vida alicerçada por invencionices, mas também o faz reconsiderar sua relação com seu filho, a única coisa que Fletcher realmente presa, no final das contas.

Como ressaltei, o fato de o papel de protagonista nesse filme ser ocupado por Jim Carrey já diz bastante sobre essa obra. E também, acredito eu, não poderia ser diferente. Esse roteiro parece ter sido escrito especialmente para o ator. Sua capacidade característica de interpretação cômica se encaixa perfeitamente com a maluquice da premissa. O absurdo acaba cabendo perfeitamente na atuação do ator e como tudo gira em torno dele na obra, isso faz com que o filme ganhe muito em relação ao seu clima totalmente alucinado. Os demais do elenco realizam seus devidos papéis bem, mas são todos ofuscados pela presença de Carrey no primeiro plano. A composição cênica de seu personagem nos passa um ar de inteligência e sagacidade. Mesmo envolvido em situações absurdas, sempre parece que ele vai tirar um coelho da cartola e na maioria das vezes é isso que ele faz. Quando não, o roteiro dá aquela ajudinha que é perdoável graças a característica cômica da obra.

Enquanto assistia ao filme um adjetivo me veio à mente: maravilhoso. Talvez isso tenha sido fruto da minha empolgação momentânea, mas eu raramente me envolvo tanto a ponto de gargalhar várias vezes com uma comédia pastelão como essa. Porém, aqui há um pouco mais que somente isso. O filme tem uma perspicácia em tratar de certas temáticas na trama. O ambiente jurídico, as relações familiares e laborais, tudo isso acaba sendo alvo de críticas hábeis pelo roteiro. São críticas singelas, mas a paródia exagerada que o longa faz desses ambientes acaba sendo muito cativante. O roteiro também é inteligente para expor como certas relações da nossa sociedade são alicerçadas por mentiras ou pelo menos pela falta de sinceridade. Claro que tudo isso é elevado à décima potência com a atuação exagerada de Jim Carrey e com as situações absurdas inventadas pelo roteiro, mas são coisas que quando você para um minutinho para pensar acaba encontrando um fundo de verdade naquilo tudo.

Confesso que o filme e o seu estilo de comédia quase passaram do meu ponto de agrado para um nível de vergonha alheia constrangedora, mas seu protagonista sendo quem é e também sua atmosfera geral, que não se leva a sério quase nunca, acabaram me mantendo entretido e muito imerso na história. Por isso que digo que só Jim Carrey pra absorver a maluquice dessa premissa. O exagero parece ser o padrão desse filme. Certas cenas chegam nesse limiar que mencionei, mas outras acabam se tornando ainda mais engraçadas por causa disso. No fim, acho que as escolhas narrativas foram muito coerentes com o que a produção pedia.

Uma cena em especial me tocou profundamente e impressionantemente não por ser engraçada, à primeira vista. No ponto de virada do segundo para o terceiro ato – aquele momento em que tudo dá errado – há uma cena que parece quebrar um pouco da atmosfera cômica do filme. Parece que ali o longa cai em uma tensão dramática que poderia descambar para o melancólico, o que não faz sentido para o filme. Mas aquele momento foi tão bem conduzido, a meu ver, e acabou me deixando tão imerso que eu realmente não consegui fugir da tensão criada pela cena, mesmo que isso não fizesse sentido nenhum para a trama até então. Mesmo assim o filme conseguiu me transmitir aquela tensão, que obviamente se transformou em mais uma gargalhada sincera. Para mim, aquele foi o clímax, não por ser o ápice real da narrativa, mas por demonstrar a habilidade de seus realizadores em mexer com nossos sentimentos.

Curiosamente essa é uma comédia leve e que se mistura com um gênero que eu adoro, o de filmes de tribunal. Com isso, o filme ainda faz uma crítica pertinente e muito inteligente a esse ambiente profissional. Além de demonstrar certas incoerências inerentes ao meio jurídico, a sua premissa curiosa ainda é capaz de brincar com outras questões paradoxais da vida cotidiana. Como o advogado Fletcher não consegue mentir, ele acaba soltando algumas verdades que todo mundo pensa, mas que ninguém tem a coragem para dizer em um ambiente mais real. Isso, por mais que faça aquilo parecer hilário no momento, acaba tocando nossa mente de um jeito intrigante e, pelo menos no meu caso, me fez pensar bastante sobre algumas questões da nossa sociedade.

Um ponto em particular também me tocou muito nesse filme chegando até a me emocionar. A relação do protagonista com seu filho foi essa questão central. Mesmo nem sendo o foco da narrativa, essa espécie de drama familiar me agradou bastante. Repito, esse não é um filme dramático. Longe disso, ele nem se esforça para desenvolver seus personagens para além dos seus arquétipos, mas essa relação em específico entre pai e filho ganhou algumas camadas interessantes para mim. Com o desenvolver da narrativa, Fletcher acaba percebendo que os prazeres supérfluos são desnecessários e que a única coisa que vale a pena em sua vida é sua relação com seu filho. Essa é uma reflexão bem básica para qualquer trama, mas que aqui teve uma singeleza bem tocante, para mim. O que também não impediu que até nessa faceta do filme fosse inserida a comédia. Me lembro bem quando em uma cena qualquer do filme o pai faz uma careta e o filho o indaga a respeito, no que Jim Carrey, no papel de pai, responde que tem gente que até ganha dinheiro com isso. Isso só prova a esperteza metalinguística do roteiro.

No mais, em relação às questões técnicas, uma coisa que me chamou a atenção foi a trilha sonora. É uma composição sonora clássica de comédias “aventurescas”. Ela pontua bem os momentos engraçados e até mesmo os mais caóticos e surreais. E me impressionou também a maneira como o filme escalonou para o seu encerramento. A obra se agarra no humor, mas também, não deixa de ser um belo exemplar de aventura, nos proporcionando uma cena de ação ousada para conclusão. Em momento algum a obra perde o ritmo que é frenético o tempo todo e acredito que por isso ainda continue sendo uma boa experiência mesmo mais de 20 anos depois de seu lançamento.

Depois de uma pausa até que bem longa na minha prática de assistir filmes por causa – ironicamente – da minha faculdade de cinema, confesso que apreciei com muito agrado essa obra. Talvez muito além do que o normal para mim. Mas como sempre ressalto, minha nota reflete a minha experiência pessoal com o filme. E isso envolve muita coisa além das próprias qualidades da obra. Enfim, de qualquer forma, se você se deixar levar pela atmosfera cômica da produção, adorar uma comédia bobalhona típica do Jim Carrey ou mesmo buscar um filme interessante para se assistir despretensiosamente, essa aqui pode ser uma grata surpresa, assim como foi para mim.

Nota do autor:

Avaliação: 5 de 5.

Gabriel Santana

Título OriginalLiar Liar
Lançamento1997
País de OrigemEUA
DistribuidoraUniversal Pictures
Duração1h26m
DireçãoTom Shadyac

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