Clássico do cinema brasileiro e mundial, de Glauber Rocha, Deus e o Diabo na Terra do Sol é um filme de 1964 que mudou as bases do cinema brasileiro. Mesmo sabendo de tamanha importância, eu assisti esse filme sem nenhuma ideia da história e posso dizer que boa parte da trama me surpreendeu. Claro que a barreira de tempo torna algumas partes da experiência um pouco menos imersivas, mas acredito que o filme realmente tem muito a dizer sobre sua época.
Acompanhamos no sertão nordestino um vaqueiro chamado Manoel e sua mulher, Rosa, que buscam sobreviver em meio as dificuldades impostas pelo clima desértico e principalmente pelos poderosos que regiam o poder na época. Sem quase nenhuma esperança, Manoel decide seguir Sebastião, um homem que prega a penitência estrema para alcançar a salvação. Junto dele, várias outras pessoas buscam o beato para tentar manter a fé e a esperança por dias melhores ainda viva mesmo num lugar onde tudo parece estar seco e morto. Com medo de que esse movimento se torne outra “Guerra de Canudos”, os poderosos contratam Antônio das Mortes, famoso matador de cangaceiros, para derramar até a última gota de sangue do beato e seus seguidores antes que esses possam representar algum risco para os governantes. É muito interessante como o filme agrega a realidade ao seu universo, citando Antônio Conselheiro e a Guerra de Canudos como uma clara alusão ao movimento do beato Sebastião. Além disso, tudo é muito crível naquela região, com cenas que chocam por tamanha veracidade. Contribui para isso a participação dos moradores locais da região. As críticas que o filme faz a maneira como a religião pode ser usada de maneira ambígua são bastante claras e ajudam a carregar a trama do longa. Esse filme me fez ter sensações bem contrárias em diversos momentos. Algumas partes me deixaram bem surpreso, outras chocado e às vezes até entediado. A maneira como as sequências são estruturadas acaba deixando, muitas vezes, o filme muito lento. Claro que isso vem de alguém que está acostumado com o ritmo frenético dos filmes atuais. A alusão de “Deus e o Diabo” me fez pensar bastante para interpretar o que isso poderia significar. Por um lado, a austeridade do beato, por outro a igreja aliada aos grandes enquanto o povo está no meio do caminho entre o inferno e o céu. Há quem só veja salvação na fé e no sacrifício e quem busque as armas para vingar os inocentes que morreram naquele sistema opressor. Seja qual lado for mais severo, ambos parecem viver uma questão de convergência. Achei curioso como o cangaço e Lampião foram abordados aqui e como essa história é bem lucida para explicitar como a vida de alguns se transformou numa espera cada vez mais ansiosa pela morte. Alguns personagens me tocaram bastante e isso ajudou a carregar a minha atenção mesmo em algumas cenas bem monótonas. Em última análise, acredito que ainda tenho muito a absorver dessa obra e espero que as minhas próximas experiências com ela me ajudem a acrescentar novas interpretações. De momento, aprecio os feitos do filme e reconheço sua gigantesca importância para o cinema como um todo.
Deus e o Diabo na Terra do Sol é uma experiência crua da realidade nordestina da época e seu diretor demonstra grande habilidade para expor tudo aquilo conciliando com a sua trama repleta de críticas sociais e políticas. Mesmo com algumas partes mais pacatas, confesso que boa parte do filme me deixou de boca aberta pelas escolhas narrativas aqui exploradas. Um clássico histórico que, com certeza, ainda tem muito a acrescentar nos dias de hoje.
Nota do autor:
Gabriel Santana

| Título Original | Deus e o Diabo na Terra do Sol |
| Lançamento | 1964 |
| País de Origem | Brasil |
| Distribuidora | Copacabana Filmes |
| Duração | 2h |
| Direção | Glauber Rocha |
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