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O Império do Desejo [Análise]

INTRODUÇÃO

O Império do Desejo, feito em 1981, é uma pornochanchada tanto escrita quanto dirigida por Carlos Reichenbach. Classificado como filme da Boca do Lixo, local onde haviam várias produtoras e distribuidoras de cinema no centro de São Paulo na década de 70, é considerado da “Boca” justamente por ter sido uma produção acessível e rápida, e por explorar a eroticidade (forma de transgressão das regras estabelecidas pela ditadura) para atingir um público maior.

Carlos Reichenbach

Carlos Oscar Reichenbach Filho, nascido no ano de 1945 em Porto Alegre no Rio Grande do Sul, foi um cineasta, roteirista, fotógrafo e músico. Realizou seu primeiro curta em 1969, chamado “Esta rua tão Augusta”, seguiu fazendo filmes de baixo orçamento e se popularizou no Boca do Lixo. Algumas de suas obras mais famosas são “Falsa Loura”, “A ilha dos Prazeres Proibidos” e “Garotas do ABC”.  

Resumo 

Sandra, recém viúva, recebe uma ligação de Carvalho (seu advogado) informando a existência de uma pequena propriedade no litoral paulista , onde o falecido marido da mesma levava mulheres escondidas. Após descobrir que a casa está sendo ocupada por grileiros, a viúva viaja até o litoral para encontrar seu advogado e reintegrar a posse do local. No meio da viagem, Sandra conhece e dá carona a um casal de hippies que também acabaram de chegar na cidade, Nick e Lucinha e acaba contratando os mesmos como caseiros. Carvalho, muito conservador, se desagrada com a decisão de sua patroa de colocar pessoas com um estilo de vida tão diferente para cuidar da propriedade, mas só aceita a decisão da mesma.       

A obra se passa principalmente em torno da casa de praia de Sandra, de como ela se relaciona com o casal de caseiros e com seu advogado, e principalmente do estranhamento na diferença de estilos de vida, e de como esses personagens lidam com sexo e liberdade. Na praia, que cerca a casa principal, somos apresentados a Di Banco, vizinho louco; duas meninas sexualmente reprimidas; Odilon, o amante insuportável que Sandra sustenta; e uma chinesa.    

Análise do frame  
Trecho do filme “O Império do Desejo” (1981)

No filme em questão, que mistura política, morte, sexo e liberdade, os personagens se opõem aos padrões sociais afirmando suas liberdades como fundamentos. Apesar das distinções de classe e princípios não se fazerem tão presentes no espaço geográfico e nos lugares que os personagens ocupam, é possível notar a diferença em como eles são apresentados ao espectador. 

No frame escolhido Sandra e Odilon se encontram encostados na porta da casa de praia, e apesar de estarem frente a frente um para o outro, eles observam as figuras distantes de Lucinha e Nick abraçados, descalços e com o mar ao fundo. Os hippies podem ser entendidos como  o  elemento  contracultural e até libertário da história, com um estilo de vida que não se preocupa em trabalhar ou se estabelecer em algum lugar (pode ser percebido na relutância em aceitar o emprego oferecido por Sandra ou na frase “nós gostamos de não fazer nada” dita por Nick).

No frame, é possível notar em como eles estão dispostos em lados opostos, a burguesa e seu amado encostados na porta de casa, dando a ideia de seu apego a bens materiais; enquanto a natureza abraça o casal de viajantes, que de certa forma são parte dessa natureza que os cerca, dessa força incontrolável, e são a representação da transgressão e da liberdade que Sandra e seu amante assistem em uma distância segura. 

Por outro lado, observando a imagem, vemos que o casal de hippies estão posicionados entre a viúva e seu amante. Esse posicionamento diz respeito  diretamente à forma com que esses quatro personagens interagem entre si.

Desde o primeiro encontro Sandra se mostra muito receptiva e até atraída pelo estilo de vida de Lucinha e Nick, ao contrário de Odilon que além de julgar, maltrata o casal e só é gentil com Lucinha por se sentir atraído por ela. Apelidado de “gigolô”, o amante de Sandra representa o burguês que toma o que não é seu pelo uso da violência e que sempre faz coisas esperando algo em troca; a viúva, representa o burguês liberal; e o casal de aventureiros, os hippies hipócritas distantes dos projetos que tentam algum tipo de transformação social. E todos os personagens são uma paródia do que era o Brasil na década de 70. 

O império do desejo traz como um dos seus principais temas os limites da liberdade sexual, o ciúme e as relações afetivas, ou seja, “onde termina o libertário e começa o promiscuo’’ frase dita pelo próprio Nick. O posicionamento centralizado dos viajantes na tela, vindo do horizonte, representa a liberdade nas relações humanas. Ambos se envolvem com outros personagens durante a trama mas respeitando a ética do relacionamento, e expressando assim essa liberdade na prática sexual descompromissada enquanto foge do padrão da sociedade, apesar de se mostrarem de certa forma conformados com a mesma. 

Os dois casais, apesar de serem de classes sociais diferentes são ligados pela pulsão pelo sexo. Mas Lucinha e Nick sempre salientam de que o sexo não é promíscuo, e que na verdade a relação deles, por serem fieis a sentimentos reais, é mais pura. Enquanto Odion parece estar com Sandra apenas por o que ela pode oferecer financeiramente, Sandra sente que tem que pagar para ser amada e desejada. Por isso, na imagem Lucinha e Nick estão lado a lado, e Sandra olha com anseio de ter esse tipo de amor gratuito e juvenil; enquanto seu gigolô tá na sua frente e ela se questiona se quer mesmo continuar com isso.               

A morte de Odilon pelas mãos do profeta, louco e bárbaro progressista Di Branco é de longe uma das mais bonitas transgressões do filme, trazendo a violência pela violência, a coragem de ir contra a opressão, o perder tudo pra virar poeta, e a memoria de que o sexo é política. 

O final do filme com o casal de hippies vivendo o que seria mais próximo da vida de Adão e Eva no paraíso, enquanto todos os outros personagens estão mortos, salienta a ideia de beleza em um estilo de vida simples com as coisas que a natureza tem a oferecer. As mortes  que no desenvolvimento do filme representavam punição finalmente acabam, agora dando lugar às “pequenas mortes” dos personagens como forma de  celebração a vida, e uma espécie de recompensa.

Gessica Lima

Título OriginalO Império do Desejo
Lançamento1981
País de OrigemBrasil
DistribuidoraGalante Filmes
Duração1h50m
DireçãoCarlos Reichenbach

Onde Assistir?
(não oficial)

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